Introdução
Leonardo da Vinci é amplamente reconhecido como um dos maiores gênios da história, com contribuições notáveis nas artes, na engenharia e nas ciências naturais. Entre seus numerosos cadernos de anotações, o Codex Leicester se destaca como uma das mais impressionantes compilações de seu pensamento científico. Este manuscrito, escrito entre 1504 e 1508, é um testemunho da mente inquisitiva de Leonardo e de sua busca incessante por compreender o funcionamento do mundo natural.
Diferente de seus outros cadernos, que abrangem uma ampla variedade de temas, o Codex Leicester é especialmente focado em estudos sobre hidrologia, astronomia e geologia. Nele, Leonardo registra suas observações detalhadas sobre a circulação da água na Terra, a reflexão da luz na Lua e outros fenômenos naturais. Essas anotações demonstram sua abordagem científica avant-garde, baseada na observação e na experimentação, antevendo métodos que só seriam amplamente utilizados na ciência moderna séculos depois.
O Codex Leicester não apenas documenta as ideias pioneiras de Leonardo, mas também serve como um precursor do pensamento científico contemporâneo. Seu impacto transcendeu os séculos, sendo reconhecido como um dos mais importantes registros da história da ciência.
1. Contexto Histórico e Científico
O Renascimento foi um período de efervescência intelectual e avanço científico, caracterizado pelo resgate dos conhecimentos clássicos e pelo desenvolvimento de novos métodos de investigação. Durante os séculos XV e XVI, o mundo acadêmico começou a abandonar progressivamente as explicações místicas e escolásticas em favor da observação direta da natureza. Esse movimento foi impulsionado pela redescoberta dos textos de filósofos e cientistas da Antiguidade, como Arquimedes, Euclides, Ptolomeu e Galeno, cuja influência moldou uma nova visão do mundo.
No plano político, a Itália renascentista era um mosaico de cidades-Estado independentes, como Florença, Veneza, Milão, Roma e Nápoles, cada uma competindo por influência e prestígio. Os governantes dessas cidades, incluindo os Médici em Florença e os Sforza em Milão, tornaram-se grandes patronos das artes e das ciências, financiando artistas, arquitetos e estudiosos. Esse mecenato desempenhou um papel crucial na disseminação do conhecimento, permitindo que figuras como Leonardo da Vinci, Michelangelo e Rafael desenvolvessem suas obras.
Ao mesmo tempo, a Igreja Católica exercia forte controle sobre o pensamento e a produção intelectual. Embora o Renascimento tenha sido um período de questionamento e inovação, as ideias científicas e filosóficas que desafiavam as doutrinas religiosas frequentemente enfrentavam resistência. A Inquisição vigiava atentamente qualquer teoria que pudesse ser considerada herética, como ocorreu posteriormente com Galileu Galilei no século XVII. Contudo, a própria Igreja também foi uma das principais financiadoras das artes e ciências, com papas e cardeais encomendando grandes obras e estudos para glorificar sua influência.
Foi nesse cenário que Leonardo da Vinci desenvolveu sua vasta gama de interesses. O Codex Leicester foi escrito durante um período particularmente produtivo de sua vida, quando ele residia em Florença sob o patrocínio de Lorenzo de Médici. Nesse contexto, a cidade florescia como um centro cultural e intelectual, atraindo estudiosos de diversas áreas. Leonardo estava imerso em estudos de engenharia, anatomia e ciências naturais, desafiando as concepções tradicionais e propondo abordagens inovadoras baseadas na observação e no experimento.
Seus escritos no códice refletem um profundo interesse pela natureza da água, pelo movimento dos rios e pelo ciclo hidrológico, questões fundamentais para a engenharia e a geologia emergentes. Na época, a compreensão dos processos naturais ainda estava fortemente enraizada nas explicações aristotélicas, que frequentemente se baseavam em dogmas filosóficos em vez de observação experimental. Leonardo desafiava essas concepções tradicionais, propondo explicações mecânicas e testáveis para fenômenos naturais, antecipando muitos dos princípios científicos que só seriam formalizados nos séculos seguintes.
Além da ciência, o Renascimento também foi marcado por mudanças culturais profundas. A invenção da imprensa por Gutenberg em 1450 possibilitou a disseminação rápida do conhecimento, reduzindo a dependência dos manuscritos copiados à mão pelos monges. Essa revolução da informação permitiu que novas ideias se espalhassem mais amplamente, facilitando a transição do pensamento medieval para a modernidade.
Nesse ambiente dinâmico, Leonardo da Vinci encarnou o espírito renascentista como poucos, ultrapassando os limites do conhecimento e desafiando tradições em busca de uma compreensão mais profunda da natureza. Seu Codex Leicester é um testemunho dessa busca incessante, revelando uma mente que estava séculos à frente de seu tempo.
2. Vida e Formação
Leonardo di ser Piero da Vinci nasceu em 15 de abril de 1452, na pequena vila de Vinci, localizada na região da Toscana, na Itália. Filho ilegítimo de Ser Piero da Vinci, um proeminente tabelião florentino, e de Caterina, uma jovem camponesa, Leonardo não teve acesso a uma educação formal avançada nas universidades, que na época eram focadas no ensino escolástico e voltadas para a formação de juristas e teólogos. No entanto, essa limitação não impediu que ele se tornasse um dos maiores gênios da história, pois sua curiosidade insaciável e sua capacidade autodidata o levaram a explorar múltiplos campos do conhecimento.
Desde jovem, Leonardo demonstrava habilidades excepcionais para o desenho e a observação do mundo natural. Seu talento chamou a atenção de seu pai, que, reconhecendo o potencial do filho, o enviou para Florença, onde, por volta dos 14 anos, ingressou como aprendiz no ateliê do renomado artista Andrea del Verrocchio. Foi nesse ambiente que Leonardo teve contato com as técnicas mais avançadas de pintura, escultura e engenharia da época. Verrocchio, um dos mestres da Renascença, ensinou-lhe não apenas os fundamentos da arte, mas também o uso de perspectiva, anatomia, geometria e mecânica, elementos que influenciariam profundamente sua abordagem científica e artística.
Além das artes, Leonardo se interessava por uma ampla gama de temas, como matemática, anatomia, engenharia, geologia, óptica e hidrodinâmica. Sua inquietação intelectual o levou a realizar experimentos, dissecações de corpos humanos e estudos detalhados sobre fenômenos naturais, algo incomum para um artista de sua época. Seu método de aprendizado baseava-se na observação direta e na experimentação, um princípio fundamental que o diferenciava dos pensadores tradicionais, que muitas vezes se baseavam apenas na teoria ou em textos antigos.
Na década de 1470, Leonardo começou a se destacar como pintor, sendo admitido na Guilda de São Lucas, uma associação de artistas e artesãos de Florença. No entanto, sua ambição ia além da pintura, e ele logo começou a trabalhar em projetos de engenharia, criando máquinas inovadoras e estudando conceitos que só seriam aplicados séculos depois. Em 1482, buscando novas oportunidades, Leonardo deixou Florença e passou a trabalhar para Ludovico Sforza, duque de Milão, onde permaneceu por quase duas décadas. Durante esse período, produziu algumas de suas obras mais icônicas, como A Última Ceia, e aprofundou suas pesquisas científicas e projetos de engenharia militar e civil.
Foi também em Milão que Leonardo teve contato com o matemático Luca Pacioli, uma das figuras mais influentes da época no campo da matemática. Pacioli é conhecido como o “pai da contabilidade” e um dos principais divulgadores do conceito de proporção áurea na arte e na ciência. Juntos, Leonardo e Pacioli desenvolveram estudos sobre a geometria e a matemática aplicadas à arte e à natureza. O fruto dessa colaboração resultou no livro De Divina Proportione (1498), no qual Pacioli explorava os princípios da simetria e da proporção matemática, enquanto Leonardo ilustrava as figuras geométricas que acompanhavam o texto.
Após a queda de Ludovico Sforza em 1499, Leonardo e Pacioli fugiram de Milão para Veneza, onde passaram um tempo trabalhando juntos. Em Veneza, Leonardo atuou como consultor militar, projetando defesas para a cidade, enquanto Pacioli seguiu ensinando matemática.
A influência de Pacioli aprofundou ainda mais a fascinação de Leonardo pelos padrões matemáticos subjacentes ao mundo natural. Ele aplicou esses princípios não apenas em sua arte, mas também em seus estudos científicos, buscando entender como as leis da geometria e da mecânica regiam os fenômenos físicos. Esse período foi fundamental para consolidar a visão de Leonardo sobre a interconexão entre ciência e arte, um princípio que definiria seu legado.
A educação e a formação de Leonardo foram moldadas por sua insaciável curiosidade e pela capacidade de aprender de forma autodidata. Seu conhecimento abrangente e interdisciplinar fez dele não apenas um grande artista, mas também um verdadeiro cientista e inventor, que antecipou inúmeras descobertas que só seriam formalizadas séculos depois.
3. Descrição da Obra
O Codex Leicester é um dos mais fascinantes cadernos de anotações de Leonardo da Vinci, oferecendo uma visão única de seu método de investigação científica. O manuscrito é composto por 18 folhas dobradas ao meio, formando 72 páginas, todas preenchidas com textos e ilustrações detalhadas. Caracteristicamente, Leonardo escreveu este caderno utilizando sua famosa escrita especular (da direita para a esquerda), o que significa que só pode ser lido corretamente com a ajuda de um espelho.
O conteúdo do Codex Leicester é uma mistura de descrições científicas, diagramas técnicos e reflexões filosóficas sobre a natureza do mundo. Diferente de outros cadernos de Leonardo, que abrangem temas variados como anatomia e mecânica, este códice se concentra especialmente em observações sobre a hidrodinâmica, geologia e astronomia. Suas páginas revelam um profundo desejo de compreender os fenômenos naturais por meio da observação direta e da experimentação, antecipando muitos princípios da ciência moderna.
Principais Temas do Codex Leicester
3.1 Hidrologia: O Ciclo da Água e a Dinâmica dos Rios
Leonardo da Vinci dedica uma parte significativa do Codex Leicester ao estudo do comportamento da água. Ele analisa o ciclo da água, descrevendo detalhadamente processos como evaporação, formação de nuvens e precipitação.
- Ele propõe que a água subterrânea, em vez de ser gerada espontaneamente dentro da Terra, é parte de um ciclo fechado, no qual a água da chuva infiltra-se no solo, se acumula em aquíferos e retorna aos rios e oceanos.
- Leonardo também investiga o movimento dos rios, explorando como a velocidade da água afeta a erosão das margens e a deposição de sedimentos.
- Ele sugere que os rios possuem um movimento dinâmico e que, ao longo do tempo, modificam a paisagem, criando vales e alterando a estrutura geológica do terreno.
- Suas ilustrações incluem esboços detalhados do fluxo da água ao redor de obstáculos, antecipando conceitos que mais tarde seriam explorados na hidrodinâmica moderna.
3.2 Geologia: Fósseis e a História da Terra
Um dos aspectos mais visionários do Codex Leicester é a maneira como Leonardo aborda questões geológicas.
- Ele sugere que os fósseis encontrados no topo das montanhas não são evidências do Dilúvio Bíblico, como se acreditava na época, mas sim testemunhos de antigas paisagens submersas, uma ideia que antecipa o conceito de mudanças geológicas graduais.
- Para explicar como conchas marinhas poderiam ser encontradas em áreas elevadas, Leonardo argumenta que o nível do mar já foi mais alto no passado e que os continentes sofreram transformações ao longo do tempo.
- Ele também especula sobre a formação das montanhas e cavernas, sugerindo que os movimentos da crosta terrestre, combinados com a ação erosiva da água, modificam continuamente o relevo do planeta.
- Essa visão é notável porque antecipa ideias que só seriam consolidadas séculos depois com a formulação da geologia moderna e da teoria da tectônica de placas.
3.3 Astronomia: Reflexões sobre a Luz da Lua e do Sol
Entre as descobertas mais impressionantes do Codex Leicester está a explicação de Leonardo sobre o brilho da Lua.
- Ele propõe que a luz da Lua não é própria, mas sim uma reflexão da luz do Sol sobre os oceanos terrestres. Embora sua hipótese estivesse incorreta (o fenômeno real ocorre devido à reflexão da luz solar diretamente na superfície lunar), sua tentativa de buscar uma explicação racional e observacional foi notável para a época.
- Leonardo também investiga o brilho da Terra vista da Lua, antecipando a ideia do Earthshine (o fenômeno da luz cinérea), que só seria descrito com mais precisão séculos depois.
- Além disso, ele especula sobre a composição do céu noturno e a propagação da luz, buscando entender por que a atmosfera afeta a coloração dos corpos celestes ao amanhecer e ao entardecer.
3.4 Método Científico de Leonardo
O Codex Leicester destaca-se não apenas pelo conteúdo inovador, mas pelo método científico implícito nas anotações de Leonardo.
- Observação rigorosa: Leonardo baseava suas conclusões na observação direta da natureza, algo raro para sua época, dominada por explicações filosóficas e religiosas.
- Experimentação prática: Ele realizava experimentos para testar hipóteses, como demonstrado em seus estudos sobre o fluxo da água e o movimento da luz.
- Uso de ilustrações técnicas: Seus esboços e diagramas detalhados servem para visualizar os conceitos que ele tentava explicar, uma abordagem que antecipa a importância da ilustração científica.
3.5 Impacto e Importância do Codex Leicester
O Codex Leicester é uma das melhores evidências da genialidade científica de Leonardo da Vinci. Seu estudo sobre a água, os fósseis e a luz da Lua demonstra uma mente que buscava compreender o mundo através da razão e da observação, rompendo com explicações mitológicas ou dogmáticas.
Embora muitas de suas hipóteses não tenham sido totalmente corretas, sua abordagem inovadora antecipa conceitos fundamentais da hidrologia, geologia e astronomia que seriam refinados séculos depois. Esse manuscrito permanece um testemunho do pensamento visionário de Leonardo e continua a inspirar cientistas, engenheiros e artistas até hoje.
4. Legado Científico
O Codex Leicester permaneceu desconhecido do grande público até o século XVIII, quando foi adquirido pelo conde de Leicester, que lhe deu o nome atual. Desde então, o manuscrito tem sido reconhecido como um dos mais importantes registros científicos de Leonardo da Vinci.
O impacto do Codex Leicester é visível em várias áreas da ciência moderna:
- Suas teorias sobre hidrologia influenciaram os estudos modernos sobre dinâmica fluvial e erosão.
- Suas observações geológicas anteciparam conceitos fundamentais da geologia.
- Seus estudos sobre a luz e a reflexão ajudaram a fundamentar princípios da óptica e da astronomia.
Um dos aspectos mais impressionantes do Codex Leicester é sua exploração dos fenômenos da hidrodinâmica e da geologia. Muito antes das formulações modernas, Leonardo já descrevia a erosão dos rios, o transporte de sedimentos e a formação dos fósseis, apontando para uma concepção inovadora sobre a história da Terra. Suas reflexões sobre a luz e a refração também anteciparam estudos que só seriam aprofundados séculos depois, influenciando áreas como a óptica e a astronomia.
A influência do Codex Leicester não se limita ao campo acadêmico. A obra ainda inspira engenheiros, cientistas e artistas, que veem em Leonardo um exemplo de pensamento interdisciplinar e criatividade aplicada. Ao longo dos séculos, suas ideias foram revisitadas e reinterpretadas, tornando-se referência tanto para a história da ciência quanto para o desenvolvimento tecnológico moderno.
O interesse contínuo pelo Codex Leicester também reflete a valorização do pensamento renascentista, que unia arte e ciência em uma busca incessante pelo conhecimento. Em um mundo cada vez mais segmentado, a obra de Leonardo nos lembra da importância de uma visão holística e interconectada da realidade.
O manuscrito continua sendo uma fonte de inspiração para cientistas, engenheiros e historiadores da ciência.
5. Obras Publicadas e Preservação
Ao longo dos séculos, os cadernos de Leonardo da Vinci foram preservados de forma fragmentada, com diversas coleções espalhadas por museus e bibliotecas ao redor do mundo. O Codex Leicester, em particular, teve uma trajetória única, passando por diversos proprietários antes de se tornar um dos manuscritos mais famosos do mundo.
O caderno foi adquirido por Thomas Coke, Conde de Leicester, em 1719, e permaneceu em posse de sua família por mais de 250 anos. Em 1980, o manuscrito foi comprado pelo empresário Armand Hammer, que o renomeou Codex Hammer e o exibiu em várias partes do mundo. Após sua morte, o caderno foi leiloado pela Christie’s em 1994, sendo arrematado por Bill Gates por 30,8 milhões de dólares – tornando-se o manuscrito mais caro já vendido.
Desde então, Gates facilitou a digitalização do Codex Leicester, permitindo que seu conteúdo fosse estudado por um público mais amplo. Além disso, ele emprestou o manuscrito para exposições em diversos museus, incluindo o Museu de História Natural de Londres e o Museu Uffizi, em Florença. Essas exibições permitiram que estudiosos e entusiastas tivessem acesso às anotações e esboços visionários de Leonardo, contribuindo para a difusão de seu legado.
A preservação dos cadernos de Leonardo é uma tarefa complexa, que exige condições rigorosas de armazenamento e conservação. O papel, envelhecido e delicado, precisa ser mantido sob controle de temperatura e umidade para evitar deterioração. Além disso, esforços contínuos de digitalização garantem que futuras gerações possam explorar o pensamento inovador do mestre renascentista sem comprometer a integridade do documento original.
Com a preservação cuidadosa e a crescente acessibilidade ao conteúdo digitalizado, o Codex Leicester continua a inspirar novas gerações, reafirmando o impacto duradouro do gênio de Leonardo da Vinci.
5.1 Principais Cadernos de Leonardo da Vinci
1. Codex Trivulzianus (1487–1490)
- Conteúdo: Estudos linguísticos, listas de vocabulário e anotações sobre arquitetura e fortificações militares.
- Descoberto: Localizado no século XVIII na coleção da família Trivulzio.
- Preservação Atual: Biblioteca Trivulziana, Castello Sforzesco, Milão, Itália.
2. Codex Forster I, II e III (1490–1505)
- Conteúdo: Estudos sobre hidráulica, pesos, equilíbrio e anotações sobre geometria e matemática aplicada.
- Descoberto: Parte da coleção do Museu Victoria & Albert, adquirido no século XIX.
- Preservação Atual: Museu Victoria & Albert, Londres, Reino Unido.
3. Codex Madrid I e II (1490–1505)
- Conteúdo: Estudos detalhados sobre engrenagens, dispositivos mecânicos, máquinas de guerra e princípios de estática e dinâmica.
- Descoberto: Redescoberto em 1965 na Biblioteca Nacional da Espanha, onde havia sido catalogado erroneamente.
- Preservação Atual: Biblioteca Nacional da Espanha, Madri, Espanha.
4. Codex Urbinas (1490–1516)
- Conteúdo: Contém notas sobre pintura e teoria da arte, que foram posteriormente compiladas no tratado Trattato della Pittura.
- Descoberto: Encontrado na Biblioteca do Vaticano no século XVII.
- Preservação Atual: Biblioteca do Vaticano, Cidade do Vaticano.
5. Manuscritos de Paris (1495–1515)
- Conteúdo: Série de cadernos cobrindo engenharia, anatomia, matemática e esboços diversos. São essenciais para compreender a abordagem científica de Leonardo.
- Descoberto: Encontrados no século XIX e adquiridos pelo Instituto da França.
- Preservação Atual: Biblioteca do Instituto da França, Paris, França.
6. Codex Atlanticus (1478–1519)
- Conteúdo: O mais extenso dos cadernos de Leonardo, com cerca de 1.119 páginas cobrindo engenharia, matemática, arquitetura, anatomia, física e invenções mecânicas. Contém projetos de máquinas voadoras, pontes e armas.
- Descoberto: Século XVII, reunido pelo escultor Pompeo Leoni.
- Preservação Atual: Biblioteca Ambrosiana, Milão, Itália.
7. Codex Arundel (1480–1518)
- Conteúdo: Inclui estudos matemáticos, ópticos e de engenharia. Contém notas sobre hidráulica, mecânica e reflexões sobre a natureza.
- Descoberto: Século XVII, chegou à Inglaterra através da coleção de Lord Arundel.
- Preservação Atual: British Library, Londres, Reino Unido.
8. Codex Leicester (1506–1510)
- Conteúdo: Explora fenômenos hidráulicos, geológicos e astronômicos. Contém reflexões sobre a erosão, o fluxo da água e a luz das estrelas.
- Descoberto: Encontrado no século XVIII e adquirido por Thomas Coke, Conde de Leicester, em 1719.
- Preservação Atual: Coleção particular de Bill Gates, que o digitalizou e emprestou para exposições em museus como o Museu de História Natural de Londres e o Museu Uffizi, Florença.
9. Codex Windsor (1508–1513)
- Conteúdo: Compilação de estudos anatômicos detalhados, incluindo desenhos de músculos, órgãos e estruturas ósseas.
- Descoberto: Parte da coleção da Família Real Britânica desde o século XVII.
- Preservação Atual: Coleção Real Britânica, Castelo de Windsor, Reino Unido.
5.2 Preservação dos Cadernos
A preservação dos cadernos de Leonardo é uma tarefa complexa, que exige condições rigorosas de armazenamento e conservação. O papel envelhecido e delicado precisa ser mantido sob controle de temperatura e umidade para evitar deterioração. Além disso, esforços contínuos de digitalização garantem que futuras gerações possam explorar o pensamento inovador do mestre renascentista sem comprometer a integridade do documento original.
O Codex Leicester, em particular, teve uma trajetória única. Após ser adquirido por Thomas Coke, Conde de Leicester, em 1719, permaneceu em posse de sua família por mais de 250 anos. Em 1980, o manuscrito foi comprado pelo empresário Armand Hammer, que o renomeou Codex Hammer e o exibiu em várias partes do mundo. Após sua morte, o caderno foi leiloado pela Christie’s em 1994, sendo arrematado por Bill Gates por 30,8 milhões de dólares – tornando-se o manuscrito mais caro já vendido.
Desde então, Gates facilitou a digitalização do Codex Leicester, permitindo que seu conteúdo fosse estudado por um público mais amplo. Além disso, ele emprestou o manuscrito para exposições em diversos museus, como o Museu de História Natural de Londres e o Museu Uffizi, em Florença. Essas exibições permitiram que estudiosos e entusiastas tivessem acesso às anotações e esboços visionários de Leonardo, contribuindo para a difusão de seu legado.
A crescente acessibilidade ao conteúdo digitalizado reforça o impacto duradouro do gênio de Leonardo da Vinci, permitindo que novas gerações explorem suas ideias e inspirações para a ciência e a arte.
Conclusão
Leonardo da Vinci foi um cientista, engenheiro e visionário muito à frente de seu tempo, e o Codex Leicester é uma prova incontestável de sua genialidade e de sua abordagem inovadora para compreender o mundo natural. Em um período em que o conhecimento ainda era amplamente dominado pela escolástica medieval e pelo pensamento aristotélico, Leonardo seguiu um caminho próprio, baseando suas investigações na observação direta e no empirismo. Suas anotações demonstram uma compreensão precoce dos princípios do método científico, antecipando descobertas que só seriam formalizadas séculos depois.
Além de seu valor científico, o Codex Leicester também é um testemunho do espírito renascentista, caracterizado pela busca incessante pelo saber, pela interdisciplinaridade e pela fusão entre arte e ciência. Leonardo não se contentava em aceitar explicações tradicionais; ele desafiava dogmas, propunha hipóteses testáveis e desenhava esquemas detalhados para ilustrar seus raciocínios. Seu trabalho demonstra que a ciência não avança apenas com teorias formais, mas com a curiosidade, a experimentação e o desejo genuíno de compreender os mistérios da natureza.
O estudo do Codex Leicester reforça a ideia de que a curiosidade e a observação detalhada do mundo são fundamentais para o avanço do conhecimento. Mais do que um conjunto de anotações científicas, esse caderno representa um verdadeiro manifesto da busca pelo entendimento do universo, inspirado pela harmonia e pela complexidade dos fenômenos naturais.
Séculos após sua criação, o Codex Leicester continua a fascinar estudiosos e admiradores de Leonardo da Vinci, servindo como fonte de inspiração para cientistas, engenheiros, artistas e inovadores. Seu legado vai além das páginas do códice; ele ressoa na maneira como pensamos a ciência, a criatividade e a interconexão entre diferentes áreas do conhecimento. Leonardo não apenas revolucionou a ciência de seu tempo, mas também deixou um modelo de investigação que continua a iluminar novas gerações em sua busca pelo desconhecido.
Se há uma lição central a ser extraída do Codex Leicester, é que a verdadeira genialidade reside na capacidade de enxergar o mundo com olhos de descoberta e de questionar incansavelmente o que ainda não foi compreendido.
Referências
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- Kemp, M., & Pallanti, A. (2017). Mona Lisa: The people and the painting. Oxford University Press.
- Farago, C. (1992). Leonardo da Vinci’s Paragone: A critical interpretation with a new edition of the text in the Codex Urbinas. E.J. Brill.
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- Gombrich, E. H. (1985). The story of art. Phaidon Press.